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Sobre as DÉCIMAS
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A Poesia Tradicional é uma das minhas paixões.
Sobre as DÉCIMAS alentejanas, encontrei o texto que a seguir transcrevo, num antigo livro de leitura da antiga 4ª classe.
O texto fala de Lázaro Beirão, o Potra – poeta popular alentejano, do século XVIII.
Tentei encontrar alguma referência sobre esse nome, mas até agora, ainda não descobri mais nada.
Assim, a única referência que encontro a este poeta popular do Alentejo é esta que aqui deixo e tenho o gosto de partilhar com quem estiver interessado na Poesia Tradicional.
O episódio narrado passa-se entre o referido poeta alentejano e o bispo D. Manuel do Cenáculo. O texto não indica a autoria nem a fonte da narrativa. Apenas informa: “Colhido da Tradição Oral”
Sobre D. Manuel do Cenáculo, colhi estas breves notas na Wikipedia:
Manuel do Cenáculo de Vilas-Boas,
nascido Manuel de Vilas-Boas Anes de Carvalho,
Lisboa, 1 de Março de 1724 – Évora, 26 de Janeiro de 1814:
foi religioso franciscano, bispo de Beja e arcebispo de Évora.
Voltando ao livrinho de leitura, páginas 28 e 29:
“Livro de Leitura”
da 4ª classe
actualizado segundo os novos programas para o ensino primário
Oficialmente autorizado o seu uso
7ª edição
1968.
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O Bispo e o Poeta Popular
Manuel do Cenáculo, bispo de Beja, vulto de grande ciência, era um exímio poeta e amantíssimo de tudo quanto à poesia dizia respeito.
Havia nessa época, nas cercanias de Beja, um pastor, poeta campestre de grande e justa fama – o Potra (1).
O bispo, tão sábio como bondoso e popular, desejava conhecê-lo.
Certo domingo, em que o pastor se dirigia, em companhia de alguns colegas, para a igreja do Salvador, a fim de ouvir missa, ao passar em frente do Paço Episcopal, um clérigo reconheceu-o e disse ao prelado:
– Vai ali o Potra, Senhor Bispo.
– Ide pedir-lhe que suba. Desejo falar-lhe.
O humilde camponês subiu a escadaria, e Cenáculo não se fez esperar:
– Como te chamas, pastor?
– Potra, servo de Vossa Reverendíssima!
– Tu é que és o tal poeta que faz versos a torto e a direito?
– Começam tortos, mas acabam direitos, às vezes, como se costuma dizer…–
– Muito bem. Mandei pedir-te que aqui viesses, pois desejo ouvir-te. Fazes-me uns versos?
– Ora, meu senhor! Sua Rev.ma está-se a divertir comigo… mas por ser a primeira coisa que me pede… vá lá. Venha o mote.
O bispo fita-o de frente e, com certa ironia, diz-lhe:
– “Nós ambos somos pastores”
Logo o Potra, de improviso:
Senhor meu, batei as palmas
que nós não somos iguais.
Vós sois o pastor das almas
e eu, pastor de animais!
Sofro frio e sofro calmas,
sinto do tempo os rigores;
vós brilhais entre os doutores,
servindo aos sábios de exemplo;
eu no prado e vós no templo,
nós ambos somos pastores.
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O Bispo pasmou ao ver confirmado, tão proficientemente, o que lhe afirmavam. Abraçou-o comovido, deu-lhe algumas moedas e disse-lhe que, quando fosse à cidade, desejava vê-lo, pois muito se alegrava todas as vezes que abraçava os colegas…
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(1) – Lê-se “Pôtra”. Era a alcunha do poeta popular Lázaro Beirão.
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Publicado por
Myriam Jubilot de Carvalho
Dia 28 de Novembro de 2018, pelas 13h 40m
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