Crónica 22 – Matemática e Poesia
Publicada, tal como as anteriores, no jornal moçambicano da cidade da Beira, O AUTARCA, na Edição nº 2946, de Quarta-feira, 02/09/2015. O AUTARCA é um jornal independente, editado on-line pelo jornalista Falume Chabane.
Grafismo das páginas: JoCrav 2015.
Desde o início da minha colaboração neste jornal, o grafismo das minhas crónicas tem sido garantido pela colaboração do Artista plástico João Craveirinha. Saliento hoje, que tanto a colaboração de João Craveirinha como a da cronista brasileira Silvya Gallanni, e recentemente a do Professor Adelto Gonçalves, cujo nome dispensa apresentação, bem como a minha própria, são por pura paixão pela partilha cultural.


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Crónica 22: MATEMÁTICA & POESIA – por MYRIAM JUBILOT DE CARVALHO (Encruzilhada de Culturas. Península Ibérica).
Myriam Jubilot de Carvalho é professora jubilada e pesquisadora há décadas, da cultura d’ Al Andalus e arábico-persa. Estudiosa da antiguidade clássica grega e romana (latina), bizantina e oriental. Está inscrita no CLEPUL: Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa. Possui obra poética publicada. (MJdC)
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Na anterior crónica 21, edição nº 2937 de 19-08-15, sobre o cientista persa OMAR KHAYYAM – matemático e astrónomo, e poeta nas suas horas de recolhimento, introduzimos esta personagem medieval num contexto generalista, citando fontes reconhecidas. O que o torna interessante, é esta associação entre Matemática e Poesia – demonstrando a relação profunda entre a ciência e a poesia.
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A Ciência e Poesia, ambas, comungam da mesma natureza criativa. Partem de um processo cognitivo comum de desenvolvimento da “alma humana”, sendo a poesia kátharsis (ou alívio) para a intensidade das actividades técnicas (como os cálculos matemáticos e astronómicos) e as emoções da vida.
É-nos, também, sugerido e referenciado que a poesia de Omar Khayyam (1048-1131) possa ter influenciado [1] alguma da poesia de Fernando Pessoa (1888-1935). Curiosamente, recordamos que o poeta português (F. Pessoa) era contabilista, uma área profissional afim à matemática. [2]
Isto elucidará muita gente, que supõe ser a poesia um acto inútil por carecer de utilidade técnico-profissional. A origem da métrica – técnica de medir versos, na escrita de poesia – é muito mais antiga do que se julga. Gregos e romanos da antiguidade clássica ocidental, assim como persas e árabes, judeus, indianos, chineses ou japoneses, não discriminavam a poesia como coisa inferior, pois os textos antigos (fosse qual fosse a matéria) eram escritos em forma poética.
As projecções do pensamento são parte de um processo matemático, mais ou menos elaborado, como tudo na vida. Resumindo, a ciência e a poesia comungam da mesma essência das matemáticas. [3]
Não nos surpreenderia que a poética africana, dos antigos egípcios, fosse a matriz da técnica e temática poéticas, através do judaísmo. É o caso do Cântico dos Cânticos, recolha feita no tempo de Salomão, de poemas dos povos que tiveram contacto com os antigos egípcios.
Por outro lado, nas fontes que temos consultado, seguimos a regra científica de considerarmos somente como credíveis, as fontes de traduções directas dos originais, por especialistas dos temas abordados. No caso de Omar Khayyam, na nossa biblioteca pessoal, temos algumas dessas traduções do original clássico persa, sejam vertidas para inglês, francês, espanhol ou português, além da versão conhecida (de 2009), traduzida directamente do persa para o português. [4]
Pedimos aos estimados leitores que de amiúde, consultem as hiperligações adicionadas aos nossos textos para uma maior dimensão de compreensão dos mesmos. A nossa preocupação tem sido o mais didáctica e resumida possível, tendo em conta o espaço reduzido de um jornal, como é a circunstância de O Autarca.? ©MJdC.
NOTAS.
1: “Há «o caso» Fernando Pessoa, que frequentou aturadamente a leitura de Umar-i Khayy?m, e usou temas emotivos do Rub?’iyat omariano na estrutura formal do «ruba’i» em parte da sua própria criação e em alguns casos de deliberada tradução de determinados quartetos, moldando-se na tradução inglesa de Edward Fitzgerald.” (Galhoz 2004, 9)
[Ver links na página seguinte]
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2: “Fernando Pessoa foi trabalhador do comércio: foi escriturário numa empresa de transitários na Baixa de Lisboa. E foi mesmo director da «Revista de Comércio e Contabilidade», cujo primeiro número saiu em Janeiro de 1926. A relação escriturário, guarda-livros, contabilista e a poesia é em Pessoa bem visível … (…)
«A par do seu Livro do Desassossego – coleção de “impressões sem nexo, nem desejo de nexo” em que ele narra a sua “autobiografia sem factos”, a sua “história sem vida” –, compõe ainda o livro comercial do escritório em que trabalha, livro de números que também o acompanha durante toda a sua vida. E é esta, precisamente, a sua tragédia: ser naturalmente um sonhador e socialmente um contabilista; ser escritor e também, por força escrevente».” Fonte: Biblioteca da Universidade de Aveiro.
https://www.ua.pt/isca/biblioteca/PageText.aspx?id=6610
3: Excerto do discurso de Banquete, no original, do Prémio Nobel de Literatura 1960, Saint John Perse (aliás Léger Alexis 1887-1975): “Au vrai, toute création de l’esprit est d’abord «poétique» au sens propre du mot; et dans l’équivalence des formes sensibles et spirituelles, une même fonction s’exerce, initialement, pour l’entreprise du savant et pour celle du poète. (…) La réponse n’importe. Le mystère est commun. Et la grande aventure de l’esprit poétique ne le cède en rien aux ouvertures dramatiques de la science moderne. Des astronomes ont pu s’affoler d’une théorie de l’univers en expansion; il n’est pas moins d’expansion dans l’infini moral de l’homme – cet univers.
http://www.nobelprize.org/…/laure…/1960/perse-speech-fr.html
“Na verdade, toda a criação do espírito é antes de mais «poética» no sentido exacto da palavra; e na equivalência das formas sensíveis e espirituais, uma mesma função se exerce, inicialmente, no empreendimento do sábio e do poeta. (…) A resposta não importa. O mistério é comum. E a grande aventura do espírito poético não fica nada atrás das grandes aberturas espectaculares da ciência moderna. Muitos astrónomos terão ficado extasiados perante uma teoria do universo em expansão; não há menor expansão no infinito moral do homem – esse universo.” (Tradução livre de Myriam Jubilot de Carvalho – MJdC).
Saint-John Perse – Biographical
http://www.nobelprize.org/…/l…/laureates/1960/perse-bio.html
4: Halima Naimova, Professora, e tradutora de língua persa para português. ? ©MJdC.
Charada – “VOCÊ CONHECE A SALADA ALGEBRISTA?”
Anote os ingredientes:
? – ce,
?? – no,
? – mate,
? – abo,
? – lho verde,
? – raba!
(fonte: www. PiadasNerds.etc.br)
Caricatura sobre Pitágoras:

“You may be right, Pythagoras. But everybody’s going to laugh if You call it a “Hypotenuse.”
Você pode estar certo, Pitágoras. Mas todos se vão rir de você se chamar a isso – “hipotenusa.” (Tradução: MJdC)
Fonte cartoon Pitágoras e a hipotenusa:
https://bcsengage.wikispaces.com/E6G5a+History+of+Math
(Publicidade TCO – Turismo e Gestão Hoteleira – Beira: Condomínio LUAS DE PRATA)
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ALGUMAS REFERÊNCIAS:
Khayy?m, Umar-i (Séculos XI-XII / 2009). Rub?’iyat. Lisboa: Assírio & Alvim. Apresentação de Maria Aliete Galhoz, agosto 2004, 9. (Selecção, tradução e notas de Halima Naimova directamente do persa para português).
Poetas do Andaluz (séculos IX-XIII / 1991). Ladrões de Prazer – poemas arábigo-andaluzes. Lisboa: Editorial Estampa. (Tradução de Fernando Couto [1924-2013] “sobre a versão castelhana” de Emilio García Gómez, 12).
[Nota da cronista MJdC: esta edição portuguesa carece de notas biobibliográficas – síntese da vida e obras dos autores]
Sena, Jorge de (1971). Poesia de 26 Séculos, I vol. (Antologia, tradução, prefácio e notas). Lisboa: Editorial Inova Lda. [Pérsia: Omar Khayyam, 88-90. Prefácio da obra: Santa Bárbara, Califórnia, 1971]
WEBSITES:
Biografia de Emilio García Gómez.
http://www.biografiasyvidas.com/b…/g/garcia_gomez_emilio.htm
Emilio García Gómez: Premio Príncipe de Asturias de Comunicación y Humanidades 1992.
http://www.fpa.es/…/premiados/1992-emilio-garcia-gomez.html…
Emilio García Gómez (1905-1995). 1º Conde de Alixares, Espanha. Arabista espanhol, tradutor do árabe para castelhano. Fonte: Universidade de Granada (Agosto 2015).
http://univex.ugr.es/pages/arabe/catedra_emilio_garcia_gomez
Sánchez, José Mª González-Serna (2008). Recorriendo los temas de la poesía arábigo-andaluza con Al Mutamid de Sevilla. (“EL POETA ES UN MENTIROSO…” ¿Hasta qué punto es sincera la poesía en ningún pueblo? Emilio García Gómez, poemas arábigoandaluces.)
http://www.auladeletras.net/material/arabe.pdf
©MJdC.
Imagem de Estátua de Ommar Khayyam no Irão:
« Statue of Ommar Khayyam in Nishapur, Irann, near his burial área.» (Estátua de Ommar Khayyam em Nishapur, Irão, perto da área do seu túmulo.)
Foto (2012) de Muhammad Mahdi Karim (Bangalore, India).
User: Muhammad Mahdi Karimhttps://en.wikipedia.org/wiki/User:Muhammad_Mahdi_Karim
‘Umar al-Khayyam (Omar Khayyam)
http://www.muslimheritage.com/…/%E2%80%98umar-al-khayyam-om…
Autor da escultura – escultor iraniano Hossein Fakhimi (?)
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«OMAR KHAYYAM foi um matemático, astrónomo e poeta persa. Segundo a Enciclopédia Britânica, nasceu em 1048, e morreu em 1131. Omar Khayyam estudou na sua cidade natal – Nishapur; e depois também em Samarcanda, notável cidade que na Idade Média foi importante ponto de encontro das rotas comerciais e das culturas da China e da Índia. Foi em Samarcanda que Khayyam escreveu o seu “Tratado sobre a Demonstração de Problemas de Álgebra” – e o prestígio daí decorrente foi tal que o sultão Malik-Sh?h, (reinando de 1072 a 1092), o convidou para reformular o calendário persa.» Excerto da Crónica 21, anterior edição nº 2937 de 19-08-15. MJdC.
Publicado por
© Myriam Jubilot de Carvalho
Dia 4 de Setembro de 2015, pelas 2h.
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